INFJ-T

1Lester

Me incomoda bastante não estar escrevendo nada nos últimos tempos. Tenho algumas ideias, seja para o blog seja para outros fins, mas tudo fica na minha cabeça, intocável e quando finalmente decido colocar no papel — ou na tela — sinto uma imensa impaciência e uma raiva pela forma que escrevo.

Aí, ontem, percebi que tem uma coisa bastante errada comigo. Nessa semana comecei a ler O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel. Nunca vi os filmes ou li alguma coisa a respeito das obras de J.R.R. Tolkien, e diria que foi bem vindo esse não-conhecimento.

Acontece que sempre que eu estou no metrô — voltando para casa depois das onze da noite, depois de acordar cedo e ficar oito horas sentado em um escritório, frequentar uma aula nem sempre prazerosa, ficar no meio de uma multidão de desconhecidos correndo e falando alto — me sinto exausto!

Minha atenção é mínima, e por melhor que seja acompanhar os hobbits e suas cantorias, manter a atenção na história é quase impossível.

Minha mente devaneia enquanto tento passar para a próxima linha, meus olhos vacilam quando tento dar sentido às palavras. E aí eu desisto. Boto meus fones para continuar na minha bolha e fingir que não tem uma multidão ao meu redor.

 

Nessas horas aparece a preguiça, a vontade de sumir de vez

Isso já estava aconteceu há alguns meses. Meu interesse por livros era bastante vago. Não que eu não estivesse lendo — pelo contrário, esse ano foi o período em que eu mais li. O problema é que eu justificava minha falta de interesse pela falta de pressa em concluir a leitura.

Por exemplo, demorei um mês para concluir ‘Chegadas e Partidas’, da Annie Proulx. Posso dizer que é um dos melhores livros que já li! Fenomenal. Mas lia de poucas em poucas páginas, na verdade, sempre dizendo: “Não, não quero terminar logo, se não fico sem nada para ler”.

Mas na hora do almoço, sentado no banco da praça, quase cochilava. Na hora de ir para a faculdade, quase cochilava. Antes da aula, sentado na sala vazia, cochilava. No fim de semana, não existia leitura na minha vida. Enfim.

Isso era só a ponta do iceberg, como dizem. No fim de semana, combinada comigo mesmo que iria escrever alguma coisa. Sentava no computador e bufava. Dizia que era uma ideia idiota, que eu escrevia mal, uma escrita passiva e sem interesse — preguiçosa mesmo — e como eu estava lendo a Sra. Proulx, e estava gostando, só estava copiando o estilo dela.

Minha irritação se expandia para minha família, vejam só. Quando meu irmão falava comigo eu já perdia o interesse, pedia para ele calar a boca. Não tinha assunto com meus pais. Tentava assistir The Sopranos, mas mesmo isso me dava raiva. Amigos… bem.

Meu emprego, nesses tempos, atingiu o nível mais absurdo de pura chatice. Eu odiava do fundo do meu coração e me culpava pela manutenção dessa rotina desgraçada. A sensação, quando dava cinco da tarde, era que eu ficaria nisso o resto de minha vida. Eu me sentia um absoluto inútil.

Acho que semana passada, finalmente atingir o ápice desse cansaço. Acordei com o corpo pesado e ânimo nenhum. Sim, eu poderia ir trabalhar, na verdade, mas não fiz esforço nenhum para isso.

Fui ao médico mais com o intuito de pegar um atestado. Eis que eu descubro que naquele momento eu estava com pressão alta, inclusive fiz um eletrocardiograma que deu batimentos bastante elevados. O doutor, um cara cabeludo e sereno me pergunta — ou afirma, não sei: “Então seu coraçãozinho está batendo rápido, é[?]”.

Fiz um exame de sangue, porque ele disse que tireoide poderia ser confundida com estresse. No fundo eu sabia que meu problema era minha insatisfação com tudo. Mas tudo mesmo.

 

Se me der na telha sou capaz de enlouquecer

 No final, o médico disse que era só uma gripe mesmo e me receitou alguns remédios. Peguei um atestado e dormi, naquele dia, das seis e meia da tarde até às nove da manhã do sábado seguinte.

Sono, aliás, eu tinha o tempo todo. Normalmente eu vou dormir uma da manhã na semana. Chegou em casa umas onze e quarenta, janto, tomo banho e nessa já é uma hora. Acordo às quinze para seis e começo tudo de novo.

Óbvio que no fim de semana as coisas não fluem tão bem assim, nesse quesito. Vou acordar lá para o meio-dia — isso quando não acordo quase às duas da tarde — e com frequência me sinto cansado quando me levanto, como se nem tivesse dormido.

E as coisas vão acumulando. Essa minha irritabilidade, meu cansaço, minha falta de vontade, tudo isso me envolve.

Eu tenho uma oscilação de humor muito grande, para falar a verdade. Tem dia que eu me sinto muito bem mesmo, de respirar fundo e querer “vencer” minha rotina. Mesmo em casa posso ser um bom filho e, principalmente, costumo ver o mundo de outra forma.

Mas, às vezes, quando acordo feliz da vida, posso mudar de humor e me transformar em um cara bem chato. Impaciente, imaginando alguém me enchendo o saco e me dando motivos para socá-lo.

Isso quando eu não sinto um imenso vazio dentro de mim. Acontece com frequência.

É como se, nesses dias, eu não tivesse um propósito e aquele sentimento de “eu sou inútil” fosse verdade. Aí as pessoas ao meu redor se tornam entediantes, cansativas. Eu olho ao redor e sinto que essa cidade é um lixo e que as pessoas não prestam.

Pior é que eu também costumo ter medo nessas horas. Medo de nada mudar, medo de tudo dar errado. E principalmente: medo de ter medo.

Meu primeiro instinto é se isolar, me afastar das pessoas. E isso não é necessariamente sumir fisicamente. Acredite, eu posso ser uma péssima companhia. Fico escondido dentro de mim mesmo, orbitando silenciosamente entre as conversas que, naquela situação, considero inútil.

Por vezes penso que estou com depressão. Acho que isso não é bem normal, sei lá. Outro desejo forte que me atinge nessas horas é a de chorar. Sem motivos. Eu paro e penso: “Como seria bom se eu chorasse agora”.

Da forma que surge, isso passa. Penso a respeito, mas não consigo achar um motivo para tudo isso. Nos fins de semanas acontece quase sempre. Aquela “depressão dominical” me afeta durante a tarde de um sábado.

 

Já não me sinto em casa nesse mundo

Desde que eu me lembre, nunca sentir pertencer a um lugar. Sempre uso a mesma desculpa: “Só estou de passagem. Não quero me prender”. Outras vezes, olho ao redor e tenho certeza que aquilo não é para mim…

São Paulo, por exemplo, com certeza não é para mim. Aqui está concentrada toda a loucura de uma sociedade moderna. E aquele vazio que atravessa as ruas tenta penetrar em nossa pele e tomar nossa mente.

Pensando nisso, é provável que em dado momento, essa loucura se aposse de mim. Passe por dentro de meus ouvidos, anuvie meus olhos e sentidos e age no meu ser por alguns raros momentos. Alguma coisa aqui dentro, eu sei, impede que ela tome todo meu ser e por muito pouco eu consigo fugir e me esconder. Nem sempre posso me encobrir; por isso, talvez, eu me sinta mal com mais frequência. Estou perdendo minha imunidade.

Então tudo se torna chato. Tudo me decepciona. Principalmente as pessoas. As pessoas que amo.

Claudia é uma pessoa que eu amo de paixão. Me sinto feliz e orgulhoso de ter ela como amiga e de ter tido a capacidade de formar uma relação com ela.

Ela é o oposto de mim e isso me fascina. Certo, temos uma conexão ‘Unagi’, por vezes. Ela sabe a piada sem graça que eu vou soltar em dado momento e eu posso completar um pensamento dela dependendo do caso.

De resto — desde música ao estilo de vida — posso dizer que somos totalmente contrários e isso não faz mal algum.

Mas a Cláudia tem a incrível capacidade de se unir a todos os mundos que ela faz parte. Com certeza ela se conecta com o mundo que ela vive no trabalho, com o mundo dos amigos de festas dela, com o mundo da faculdade e, ouso dizer, ela também está conectada com um mundo que ela já não faz parte, mas que — sem se prender a ele — a faz ser quem é.

Como eu sou o inverso de Cláudia, eu não me sinto conectado a nenhum dos mundos que participo, isso quando participo de um. Estou sempre uma frequência a menos do que as ondas que formam esses mundos.

Eis o problema. Eu quero que Cláudia seja alguém desse mundo onde estou — um mundo estranho, às vezes sem forma, outras vezes o único abrigo que tenho —, mas para isso ela tem que renunciar aos demais mundos dela. Estão percebendo a loucura?

Cláudia é só uma das — poucas — pessoas que eu gostaria que existisse somente nesse emaranhado que forma meu ser, meu existir. E eu tenho absoluta certeza que essa renuncia é impossível. Quando ela deixar um desses mundos, ou não se integrar a um novo, ela deixa de ser a Cláudia que eu conheço.

E nesse medo dela deixar esse meu mundo definitivamente, eu faço de tudo para expulsá-la antes — E expulsar os poucos habitantes dessa aldeia também…

É aí que esses sintomas acima acontecem — fortalecidos pela loucura errante de São Paulo — e eu passo a me isolar, expulsar as pessoas ao meu jeito.

Sei que isso é assunto para um psicólogo, mas escrever ao menos me dá um conhecimento que apenas sentindo eu não entenderia. Na minha cabeça, já que as pessoas sempre deixaram de serem meus amigos, mais cedo ou mais tarde, Cláudia e todo o pessoal da faculdade estará bem longe de mim.

Claro, isso só vai acontecer se eu quiser.

 

É este o fim ou a calmaria antes da tempestade?

No epicentro de tudo isso está minha vontade de viver. Por isso eu leio muito. Ver os personagens saindo de sua zona de conforto, enfrentando desafios, se surpreendendo com sua própria força, tudo isso me inspira.

Olhar para o lado e ver novamente as pessoas que não conheço pegando o ônibus no mesmo horário de sempre me desanima. A rotina deles reflete a minha. A inercia deles me enfraquece, a única solução é me esconder nas músicas e histórias.

Porque eu me preocupo, de alguma forma. Sei que o motivo de meu cansaço e desanimo é devido ao jeito que o mundo é — mas não encontrar um novo caminho é meu conformismo. Um sistema que nos dar cada dia menos opções, controla todas as formas de vida e cria padrões absurdos apenas para aqueles que detêm o poder possa continuar mandando.

Na minha cabeça só há uma coisa para fazer: encontrar maneiras de desatar esse laço ideológico que nos amarra, expandir nossa limitada liberdade.  Somos, sim, escravos da distração que o capitalismo, o neoliberalismo, que seja, cria para fecharmos os olhos para a complexidade do mundo.

E confesso que essa complexidade é um dos motivos de minhas preocupações. (Como pode alguém sofrer pela forma que o mundo é? Não basta nos adaptarmos e viver de uma maneira menos nociva?).

(Para mim, não). É incrível, mas não me desligo desses pensamentos “sociológicos”. É como um acidente de trem. É horrível de se ver, mas não posso deixar de olhar. Quanto mais olhamos para o mundo mais assustados ficaremos. Mais a minha própria visão idealizada do mundo se desfará.

Por mais que eu faça faculdade, tenha um emprego, pense no futuro, não sinto que tenho um propósito maior. Não quero mudar a complexidade do mundo. Quero acordar de manhã e perceber que vale a pena viver dessa forma. Quero me sentir incluso, quero pertencer a algo.

No fim, o que me aflige é o medo. E olha: hoje em dia tudo é usado para temermos. Perto do Terminal Jabaquara há um CAT (Centro de Apoio ao Trabalhador), a fila está cada dia maior. Meu medo também.

Vai chegar a hora, já diria Dumbledore, que teremos que escolher entre o que é fácil e o que é certo. Temer é legitimar todos os mecanismos do conformismo.

Há tantos blogs aqui mesmo no WordPress, incontáveis, eu diria. Será que nenhum desses escritores anônimos poderá fazer a diferença com suas palavras?

Será que todas as ideias, as folhas escritas, nossa visão não poderá se tornar em algum momento algo para se refletir. Ou usamos essas palavras apenas para nossa própria fuga?

Óbvio que um dia quero escrever um livro, uma história bem contada e óbvio que quero ser publicado, ver, nem que seja um grupo pequeno, discutindo sobre o que escrevi. É tão utópico isso?

Entendem por que essas crises me afligem com grande frequência? Não queria terminar esse texto de forma negativa, queria realmente ter uma resposta, por menos clara que fosse.

Talvez seja o caso da “Jornada do Herói”, onde o que importa é o que aprendemos no caminho e não o resultado da aventura… Ou talvez eu não buscar o isolamento, me amedrontar com coisas que não estão minimamente materializadas em um futuro distante seja uma solução. Não temer os inúmeros “mundos” e possibilidades que eles me tragam ou mesmo fazer parte do mundo de outra pessoa…

Também não quero encher esse texto com um emaranhado de afirmações filosóficas sem profundidade alguma, mas… o problema não é o risco, mas o quanto que esse risco vale a pena.

… And if you have a minute why don’t we go… Talk about it somewhere only we know?

This could be the end of everything. So why don’t we go. Somewhere only we know?

2 comentários em “INFJ-T

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  1. É incrível o quanto sua rotina se parece com a minha. E todo o esgotamento mental, a insegurança quanto a escrita, procrastinação com a leitura e os momentos difíceis com família/trabalho e faculdade.
    Sei exatamente o que é essa crise de identidade, sentir que não se encaixa e a sensação de que tudo é provisório e de que já não temos mais tempo suficiente.
    Nunca procurei ajuda e tenho tentado lidar com isso mudando alguns hábitos e estipulando metas curtas, indo um passo de cada vez. Ainda não tenho uma conclusão, mas espero que de certo.
    Ótimo texto, obrigado por isso.

    Curtido por 1 pessoa

    1. Obrigado, você, Samuel! Dá até um alívio perceber que não sou o único nessa crise existencial, kkkkk, e nunca será, claro.
      Metas curtas, um dia por vez, isso ajuda, sim, o resultado nós vemos com o tempo.
      Acho que devemos continuar escrevendo, por pior que imaginemos que pode estar sendo a história! Só escreva!

      Um abraço!

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